Decisão judicial barra aumento de taxas portuárias em Paranaguá e Antonina
A nova tabela de taxas portuárias de Paranaguá e Antonina foi parar na Justiça. A previsão era de que os valores alterados passassem a ser cobrados a partir de 20 de setembro, mas uma liminar segurou as mudanças para que sejam esclarecidas dúvidas sobre o formato de cálculo e os impactos na cadeia produtiva. Como o JB Litoral antecipou em agosto, os portos brasileiros estão passando por um processo de padronização dos parâmetros de cobrança e as unidades do Paraná foram as primeiras autorizadas a colocar o novo modelo em prática. A proposta gerou uma série de questionamentos e, agora, ficará em suspenso até uma decisão judicial.
Em 2019, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) publicou a resolução normativa nº 32, determinando que todos os portos do país passassem a adotar os mesmos parâmetros para cobrança. A medida visava, entre outros motivos, atender a pedidos de operadores e armadores, que alegavam que os portos brasileiros usavam unidades de medida diferentes – e que não seguiam os mesmos critérios praticados internacionalmente.
A Antaq criou um modelo fixando a unidade de medida para cada taxa e deu um prazo até o início de 2021 para que cada autoridade portuária enviasse quais seriam as adequações necessárias em suas tabelas. Em tese, não deveria se tratar de aumento de taxas, mas na prática algumas operações podem ficar mais caras. Em entrevista ao JB Litoral em agosto, o diretor-presidente da empresa pública Portos do Paraná, Luiz Fernando Garcia da Silva, informou a intenção de aplicar descontos tarifários para evitar aumento de preços. Ele enfatizou, então, o compromisso de não gerar impacto repentino na cadeia produtiva, concedendo um período de adaptação a partir de redutores que manteriam os valores nos mesmos patamares praticados nos últimos meses.
Descontentamento
Formalmente, não houve uma reunião específica para tratar do assunto entre o Sindicato dos Operadores Portuários do Estado do Paraná (Sindop) e a direção da Portos do Paraná. Há relatos de conversas isoladas e também de um encontro da diretoria administrativa financeira da estatal com representantes da Associação dos Terminais do Corredor de Exportação de Paranaguá (ATEXP). Além disso, segundo Luiz Fernando, a questão foi debatida em pelo menos três reuniões do Conselho de Autoridade Portuária (CAP) – nas duas primeiras ainda sem os valores, que estavam sendo calculados, e na última já apresentando quais seriam os procedimentos a serem adotados e a proposta de redução de impacto.
Assim que os preços foram divulgados, os operadores começaram a fazer contas e chegaram à conclusão de que teriam impactos diretos. Também consideraram que a proposta de desconto não traz garantias para a operação. Passaram a questionar a forma como o processo de reavaliação das tarifas foi conduzido e pediram acesso integral aos documentos que embasaram a mudança. Como não tiveram todas as dúvidas respondidas, os operadores decidiram procurar o Judiciário.
O presidente do Sindop, Edson Cezar Aguiar, comenta que houve uma reunião às vésperas da data em que os novos valores entrariam em vigor e que a assembleia decidiu pelo caminho judicial. Em nota, a Portos do Paraná destacou que está apenas seguindo a exigência dos órgãos federais quanto à padronização da tabela. E que optou por aplicar o desconto temporário, por quatro meses, prorrogável até que sejam concluídos os cálculos de bônus por produtividade. “O desconto, portanto, faz com que os operadores, hoje, paguem exatamente o que já vinha pagando”, diz o texto, que reforça a abertura para o diálogo, “sempre que a comunidade portuária necessitar de esclarecimento em relação às tarifas”.
Liminar aponta impactos no setor e dificuldade de acesso a documentos
O juiz substituto da 1ª Vara Federal de Paranaguá, Guilherme Roman Borges, acatou os argumentos apresentados pelo Sindicato dos Operadores Portuários do Estado do Paraná (Sindop) e concedeu liminar suspendendo os efeitos das Ordens de Serviço (OS) que oficializavam as novas tabelas, publicadas em 9 de setembro.
De acordo com o texto da decisão judicial, o sindicato apontou que os valores propostos causariam expressivo aumento no custo tarifário, sendo 15,85% no segmento de fertilizantes, 24,33% no de importação de cereais, 38,51% no segmento de celulose, 6% para o de granel exportação, 5% para os granéis líquidos e 47% nas movimentações originadas no porto organizado de Antonina. Pelo levantamento, a mudança nas taxas representaria R$ 90 milhões a mais ao ano para a Portos do Paraná.
O sindicato ainda argumentou que aconteceram reajustes recentes, em 2018, de 4,2%, e em 2020, de 6%. E pontua que não há qualquer fato econômico, financeiro, político, operacional ou de outra ordem, que justifique a “revisão portuária” em valores muito acima da inflação no período. Sobre a política de descontos, publicada em portaria no dia 15 de setembro, o sindicato destacou que os redutores caracterizam “mera liberalidade da autoridade portuária e poderão ser revogados a qualquer tempo, causam incerteza aos operadores portuários”.
Sobre a tentativa de acesso à documentação, o Sindop recebeu como resposta que o “processo contém toda a estratégia empresarial, de custos e lucros da autoridade portuária para os próximos anos, informação tida como pessoal, que somente o titular original de tais dados pode conceder acesso, sob possibilidade de sua publicização trazer severos danos comerciais à empresa”.
O juiz concordou com os pedidos dos operadores, destacando que não foi apresentada justificativa de ordem técnica e econômica para o significativo aumento e que o Sindop não recebeu respostas satisfatórias, enfatizando que a suposta necessidade de sigilo “para proteger a estratégia empresarial da autoridade portuária para os próximos anos não se coaduna com os princípios que devem nortear a Administração Pública”. O magistrado deu prazo de cinco dias, a partir da notificação, para que os documentos fossem entregues, e mais 30 dias, depois da entrega, para que o Sindop apresente uma contraproposta. Deverá ser realizada uma audiência de conciliação.
Nota da Antaq
Questionada pela reportagem do JB Litoral, a assessoria de comunicação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários enviou nota à redação. “Os procedimentos de reajuste e revisão tarifária dos portos organizados são definidos e regulamentados pela ANTAQ, conforme atribuição legal da Lei nº 10.233, de 2001 (art. 27, VII). As revisões tarifárias dos portos de Paranaguá e Antonina foram aprovadas pela ANTAQ obedecendo rigorosamente todos os requisitos e procedimentos previstos na legislação específica e nas normas da Agência. Cabe destacar que a ANTAQ divulga a íntegra de suas decisões sem qualquer restrição de acesso em sessões públicas transmitidas ao vivo pela internet, obedecendo o sigilo legal quando os processos se encontram em tramitação. Em relação à liminar da Justiça Federal do Paraná, a ANTAQ está avaliando e oportunamente irá se pronunciar no processo”.
Histórico
Desde 2007, operadores depositam diferenças tarifárias em conta milionária
Não é a primeira vez que as tabelas de taxas portuárias geram reclamações e vão parar na Justiça. Em 2007, quando o comando do porto ainda estava nas mãos de Eduardo Requião, irmão do então governador Roberto Requião, pediu ao Sindop uma contribuição pecuniária por cinco anos, para resolver déficit financeiro, o que acabou se tornando uma tentativa de incorporação às tarifas portuárias, ao final do prazo combinado. Algo que desagradou os operadores portuários – que, por sua vez, recorreram ao Judiciário.
Em decisão liminar, ficou determinado que a diferença contestada deveria ser depositada em uma conta judicial. E isso vem acontecendo desde então, há mais de uma década. Ainda não foi tomada uma decisão final pela Justiça, que continua analisando as questões de mérito nas instâncias iniciais, sem previsão de um desfecho. Enquanto isso, a conta bancária acumula volumes consideráveis.
Entretanto, em 2017, na gestão do superintendente Luiz Henrique Tessuti Divino, o Sindop foi informado de que o montante dos recursos deste fundo de contribuição, algo em torno de R$ 350 milhões, havia sido repassado, de forma irregular, para a Fazenda do Estado do Paraná. A entidade judicializou o caso e, com a tramitação se arrastando pelos tribunais, diante da dúvida se o caso deveria ser analisado na Justiça Estadual ou Federal, a ALEP abriu uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), em 2017.
A CPI discutiu a legalidade do Governo do Paraná ter acesso desses recursos do fundo de contribuição, alimentado pelos operadores portuários há uma década.
O JB Litoral foi o único veículo de comunicação que acompanhou toda a CPI das Tarifas Portuárias, a qual contou com a participação de onze deputados, entre eles o atual líder do governo do Estado, Hussein Bakri, Ademir Bier, Dr. Batista, Paulo Litro e Tião Medeiros.
O Sindop questionou judicialmente a incorporação do aumento de 21,3% nas tarifas portuárias. “Os Fundos não devem entrar na composição daquilo que foi majorado”, defendeu o Sindop, na época.
Em seu depoimento, o penúltimo, antes de encerrar a CPI, Edson Aguiar, presidente do Sindop, apresentou um documento que surpreendeu os membros da CPI: um estudo que concluiu que a APPA teria investido num excesso de reajuste tarifário no período de 2010 a 2015 no montante de 50,09%. O levantamento, que estava guardado no cofre do Sindop até o dia da reunião na ALEP, foi feito por uma consultoria formada por ex-professores universitários com base nos dados do Portal da Transparência da APPA.
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